Mais um dia na minha vida, o segundo de minha carreira e também o mais melancólico até então. Acordaria desanimada, ainda afetada pelo o que havia acontecido, e me arrastaria até o banheiro. Me olharia no espelho por algum momento, me sentindo pequena, frustrada. Daria um longo suspiro, vestindo alguma roupa negra como os meus pensamentos antes de sair do quarto.

Descendo as escadas, rumo à cozinha, pegaria algo leve para comer e me sentaria à mesa. Caso meu pai ou minha mãe estivesse presente, diria apenas um breve: — Bom dia. — Caso só um estivesse ali, não perguntaria sobre o paradeiro do outro, pois não conseguia focar em nada direito. Caso nenhum estivesse ali, apenas comeria em silêncio, ansiosa pelo fim do dia, quando poderia voltar a dormir e fugir mais uma vez daquele pesadelo.

Partiria de casa rumo ao QG, andando sem pressa. Em contraste com o dia anterior, quando faria vinte missões num dia se possível, hoje eu não pretendia realizar nenhuma, tanto que sequer havia vestido o uniforme. Entraria e seguiria rumo à tesouraria (?), sem me atentar ao que estivesse acontecendo ao meu redor. — Olá, vim pegar o meu salário. — Diria sem muita convicção, esperando e colocando o dinheiro no bolso sem sequer contar, seguindo agora para fora do QG.

Havia decidido que, antes de proteger alguém, eu precisaria aprender a me proteger primeiro. Para isso, teria que ficar mais forte, muito mais forte. E que forma melhor de começar do que tornar meu escudo mais resistente? Se eu cuidar dele com carinho, ele me protegerá e, então, eu poderei proteger os outros. E é para isso que esse dinheiro serviria.

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— O-obrigado, s-senhor! — Murmurei, meio perdida. Sequer o havia visto se aproximando de mim, parando apenas quando sua mão segurou meu ombro e falando apenas quando ele já se afastava. Sequer havia batido continência, percebia agora, dando um longo suspiro. Segui o planejado e peguei o dinheiro das missões, por mais que achasse não o merecer, refazendo o caminho pelo QG.

De cabeça baixa e distraída, acabei por me perder e, quando me dei conta, estava diante de um ferreiro, meio que em transe ao olhar para o fogo e ouvir o som ritmado de metal contra metal. — Não, ainda não! — Falei comigo mesma, sacudindo a cabeça e dando meio volta. Eu queria melhorar meu escudo o quanto antes, mas precisava fazer algo antes, o ferreiro teria de esperar.

Seguiria então até uma floricultura, indo até o balcão e esperando que alguém viesse me atender. — Bom dia. — Saudaria, tentando abrir um leve sorriso, mas ainda ouvindo minha própria voz distante e monótona. — Gostaria de comprar seis pequenos buquês. Cada um com três flores ou rosas… — Diria assim, pois não sabia a diferença entre as duas. — Uma azul, uma branca e uma preta. — As duas representando a marinha e a outra o luto em que me encontrava.

— Obrigada. — Diria ao receber o pedido, pagando pelas rosas/flores usando o dinheiro recém adquirido. Devidamente equipada, seguiria rumo ao cemitério. Caso o enterro ainda estivesse ocorrendo, me manteria distante, tentando me ocultar da visão dos familiares que havia visitado no dia anterior. Observaria e esperaria até que não houvesse mais ninguém ali, a não ser eu e os coveiros.

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Objetivos:

Aquele lugar era lindo, em outro momento eu teria aberto um sorriso de orelha a orelha e meus olhos teriam brilhado como jóias, mas hoje eu dei apenas um leve e breve sorriso. Quem sabe outro dia eu volte ali…

Peguei os buquês, paguei e sai. Tudo parecia um borrão ao meu redor, meio cinza, estagnado. Quanto havia custado mesmo? Já havia esquecido, mas não importava. Tudo isso era sem sentido perante a morte, então segui em frente.

Permaneci no cantinho, escondidinha atrás de uma das poucas árvores do cemitério, esperando que todas aquelas pessoas fossem embora. Eram tantas… Tantas! Suspirei, triste, e me virei, ficando de costas para eles e me encostando na grande árvore, apertando os buquês contra o peito.

Ainda assim, não tinha pressa, e esperei em pé mesmo, olhando para o vazio e pensando em como as coisas poderiam ser diferentes. Melhores! Outro suspiro. Bem, não há como enfrentar o inevitável, apenas aceitá-lo. Sabia disso, embora não fosse tão simples assim na prática.

Meus ferimentos não haviam me deixado cicatrizes, minha pele continuaria alva e lisa, assim como antes, mas aquele dia iria assombrar meus sonhos pelo resto da minha vida, uma cicatriz na minha alma que nunca iria sarar. Talvez até abrandasse com o tempo, esperava por isso, mas nunca iria desaparecer por completo.

Após horas, finalmente estava a sós, na medida do possível, e segui rumo aos túmulos. — Isso. — Disse aos dois, ainda sem muita convicção na voz. Sem pressa, iria de um em um, ajoelhando-me em frente a cada túmulo, colocando o buquê sobre ele e fazendo uma breve prece. Ao terminar, me levantaria e daria alguns passos atrás, de forma que pudesse olhar para todos os túmulos de uma única vez. — Obrigado por tudo. — Diria à todos, curvando meu corpo com as mãos nas coxas. — E adeus! — Com um esforço hercúleo, abriria um largo sorriso, o primeiro desde o incidente. Um sorriso para os meus amigos, embora tenhamos compartilhado pouco tempo juntos. Não o primeiro que havia mostrado a eles, mas o último.

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Após enxugar os olhos, me despediria com um aceno dos dois homens e seguiria em frente, de queixo erguido e de sorriso no rosto, apesar dos olhos vermelhos. Sentia-me mais leve, finalmente, ao mesmo tempo que era como se eles estivessem por ali, invisíveis, mas me observando de longe. Sentia-me segura e meu humor clareou um pouco. Animada, correria até o porto.

O esforço e o desgaste que sentiria nas pernas e nos pulmões me fariam focar no meu corpo e dar um momento para a minha mente descansar um pouco, esquecendo aquilo que já me atormentava a tempo demais. Respirando fundo e limpando o suor da testa, pararia por um momento para recuperar o fôlego, apoiando as mãos nos joelhos.

Após um ou dois minutinhos, seguiria para a área do porto mais próxima ao mar, observando os estandes e os mercadores, atenta aos seus gritos e aos produtos que ofereciam. Hoje eu estava ali atrás de algo bem específico que só era possível encontrar ali na ilha.

Era um coral conhecido como Coral Memento. Ele normalmente é extraído por mergulhadores ao redor do cemitério marítimo e há uma frase em uma língua antiga que diz 'Memento Mori', que significa 'Lembre-se da Morte' ou 'Lembre-se de que você é mortal'. Por mais mórbido que fosse o pensamento, não conseguia pensar em nada melhor para mim naquele momento.

O coral tinha propriedades interessantes que deixariam o escudo mais resistente e seu significado cairia como uma luva para o significado que aquele escudo tinha para mim. Pois eu me lembraria. Havia prometido e pretendia cumprir. Eu me lembraria!

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Sem demora eu consegui encontrar o que buscava e era mais barato do que havia imaginado. Estúpida mim, achando que seria caríssimo, sendo que era apenas um item para produzir outro item. Um pouco mais animada, agi por impulso e levantei ambas as mãos. — Quero dez! — Por que diabos eu queria tantos, sendo que só pretendia usar no meu escudo? Vai saber, loucuras da minha mente. Mas já que era baratinho, melhor comprar um bocado agora do que deixar para depois. Quem sabe dá até para fazer uma armadura completa com eles, imagina que interessante!

De qualquer forma, pagaria e esperaria pelo senhor embalar e me dar os dez corais. Dali, seguiria andando calmamente pelo porto, observando as outras tendas apenas por curiosidade, já que não pretendia comprar mais nada no momento. Com a brisa do mar, o som das ondas e aquele burburinho sempre presente no porto, senti-me um pouco mais leve, um pouco mais feliz. Havia nascido e crescido ali, aquela era a minha ilha e seu ambiente me trazia um certo conforto.

Era hora de finalmente respirar fundo e seguir em frente. Amanhã seria um novo dia e faria o possível para ser diferente! Seria produtiva, faria missões e ajudaria minha ilha a prosperar e sua população a viver melhor e mais segura. Essa era a minha missão de vida e ela não havia mudado! Amanhã tudo será melhor! Tenho certeza! E, com esse pensamento, voltaria para casa, com um leve sorrisinho no rosto, um pouco mais próxima do meu eu padrão.

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