I - Suit & Tie

    Maldições eram jogadas ao vento tal como os grãos de areia que trazia consigo nas dobras das vestes, de muito longe vinha este, contudo, ao olhar o velho mapa que trazia por debaixo do braço, agora já rabiscado em um ataque sutil de fúria, percebeu que tinha se desviado bastante do real objetivo. “Las Camp” foi o que disse ao conhecido marujo que o levou até ali, esperando encontrar uma cidade completamente diferente, mas a medida que se aproximava do porto, o brilho no olhar ia se esvaindo com uma fagulha fraca na nevasca, apagara-se, foi só então quando desembarcou por completo e teve o desprazer de ver a velha Fragata cruzar a linha do horizonte que notou o equívoco que havia cometido - Estou na ilha errada! - Colocando a mão na testa e, agora, suspirando fundo vendo que não tinha mais jeito tanta reclamação, pôs-se a pensar no que fazer adiante.

    Não estranhou muito quando ouviu soar aquele nome de tão alto, se bem que quando seu pai havia lhe dito ele não soava como de tal maneira “Sirarossa, era sirarossa seu animal” em um momento de iluminação repetia para si recordando, tarde demais, perfeitamente o nome que ele havia lhe dito para dar ao marinheiro na hora de pegar viagem, mas como diabos Sirarossa se tornou Las Camp? Nhu tinha receio de que não era apenas uma obra de sua imensa burrice, mas talvez pudesse encontrar alguma coisa no pouco tempo que ficaria no local, isto é, até conseguir encontrar caminho para Sirarossa.

    - Bom… Acho que agora não tem mais jeito, ir nadando até lá é inviável… - Pensando alto, calculou uma rota por água no que restava do mapa, mas vai saber o que tinha por aquelas águas, ou talvez o tempo que levaria para chegar até lá, com toda certeza é muito melhor esperar pelo aconchego de uma embarcação, isto é, se conseguisse pegar alguma na sua condição de híbrido.

    Já imaginando que poderia chamar atenção indesejada, cobriu a cabeça com o capuz, como de habitual, mas os braços ainda expondo aquelas adornadas escamas, chega a ser um pouco estranho pensar em um motivo para esconder o rosto ao invés das características que mais o denunciavam como um híbrido, mas pelo clima de sua terra natal, a hidratação era quase um tique. Outra coisa que lhe causou um choque, o clima. Depois de certo tempo naquela doca, se já não tivesse chamado atenção o bastante, pegaria suas coisas, como se fosse de algo incrível, não carregava nada além de sua lança, posta nas costas com o cuidado de uma porcelana, adiante, faria seu caminho adentro da ilha, alçando ao palmo da canhota a foto de um parente distante que talvez viria a encontrar naqueles mares.

    Sorrateiro, iria Nhu a caminho de um QG da Marinha “Se não estou errado, os cartazes devem ficar por lá, devo encontrar alguma coisa andando pelos mesmos locais que esses procurados” pensou, dessa vez não tão alto, em uma forma mais objetiva de encontrar as ligações do submundo, era claro que ninguém por ali deveria ser um grande chefe da máfia, mas a linha ligava tramas como teias de aranha levavam ao caminho de seu feitor, cedo ou tarde, poderia encontrar ligações em todas elas, só bastava encontrar um equilíbrio entre se fazer de um Caçador de Recompensas e um Iniciado no submundo - Embora eu ainda não tenha me decidido qual dos dois pretendo ser… -

    O som das ondas batendo no casco do navio agia como um metrônomo, distraindo Raava de interferências externas e focando apenas em si mesma enquanto meditava. Já havia acordado há algumas horas, uma péssima e curta noite de sono que durou três horas e sete minutos, como de costume, logo que levantou tomou seu banho de quatro minutos e trinta e sete segundo, escovou os dentes por dois minutos e vinte um segundos, e ainda despida voltou à cama para começar sua meditação por mais três horas.  Não se tratava apenas de uma orientação ou paz espiritual, aquele na verdade era o único método que a garota tinha de suprir suas horas restantes de sono sem precisar ter aqueles pesadelos, por sorte o capitão a havia cedido um quarto particular, e era graças a tal gentileza que Raava podia descansar com um pouco mais de tranquilidade.

    Chegava a hora, seus olhos se abriam lentamente fitando as roupas penduradas por cabides no outro lado do quarto, detestava aquela vestimenta, porém precisava causar uma boa primeira impressão, e novamente, por um pouco de sorte e bom gosto, ao menos as cores lhe agradavam. Raava se levantava pela segunda vez, se dirigindo até sua vestimenta, uma camisa social de manga curta num tom azul claro, terno e gravata de cor azul marinho, este que não o vestia exatamente, na verdade preferia por colocar o paletó por cima dos ombros como uma capa, nos pés uma sapatilha preta, não daquelas mais confortáveis, na verdade doíam só de andar por mais de vinte minutos, mas por fim, um par de óculos escuros! Porque sejamos honestos, um agente do governo sem óculos escuros parece mais um agente de finanças. Todo esse processo levava exatamente quatro minutos e quarenta e sete segundos.

    Mas a este ponto você caro leitor deve estar se perguntando o por que dessa fixação por tempo, para Raava, aquilo era apenas um jogo, uma lembrança engraçada da mania que seu mentor relojoeiro tinha e tentou ensiná-la, graças aos céus a garota não se tornou compulsiva igual ao homem, mas fazer aquilo em momentos de ansiedade, não ironicamente, ajudava a passar o tempo. Isto pois segundos os cálculos de Raava, sua ilha de destino já estaria à vista a qualquer instante. - Bom dia! - Saiu de sua cabine comprimentando os marujos pelo caminho até deque, em seu andar até o parapeito ostentava um belo sorriso, enquanto erguia os óculos para observar melhor onde seria sua primeira missão: Las Camp.



    Havia sido uma viagem longa da Grand Line até ali, ao mesmo tempo que tinha ânimo para finalmente começar sua carreira, Raava também se sentia um tanto quanto receosa por não saber nem mesmo o motivo de ter sido transferida especificamente para aquela ilha, “O que diabos pode ter aqui exatamente?”, era o que pensava nos poucos naus que a embarcação concluía. Ao fim da viagem agradeceu a tripulação pela estadia, e sem pausa para inspecionar a cidade mais de perto se dirigiria até o QG da Marinha, olhando e observando incontrolavelmente para todas as direções daquele novo ambiente.

    - Ei meu chapa. - Chamaria a atenção do primeiro marinheiro que visse ao chegar no QG. - Eu acabei de ser transferida pra cá e tenho que me apresentar, quem é o oficial de dia?

    Estava adiante por uma marcha desorientada, sendo um recém desembarque por um terreno totalmente novo, caminhar por aquelas avenidas se saber onde daria cada curva, foi quando numa delas esbarrou em alguém - Uh… Perdão senhora... ita- Faltava-lhe a voz, sua visão percorria aquela de baixo para cima, julgando por intermédio de seus trajes uma formalidade, contudo, percebia que tão como ele se tratava de uma pessoa, mulher, jovem, as interações sociais nunca foram seu forte, não sabia muito bem como deveria cumprimentar um estranho que havia esbarrado, geralmente eles só os ignoravam, mas por alguns instantes Nhu conseguia sentir tudo ao seu redor congelar - Senho...rita, desculpe não te vi por aqui… - Seguia por então, determinado a tomar o caminho.

    Para dar-lhe as costas foi ligeiro, escondendo um pouco a feição de vergonha, contudo, ao denotar as cores nas vestimentas, uma vez que teve todo o traçar daquelas com uma longa vistoria de baixo para cima, não pode deixar de se questionar sobre a natureza das quais, ainda julgado pelo fato de estar perdido naquela ilha, talvez uma informação seria útil, quem sabe ela tivesse alguma informação de onde ficava esse tal QG - Erm, com licença… Oi, novamente… Sabe me dizer como eu consigo encontrar a base da marinha seguindo por aqui? - Com o passo, seus membros ficavam mais relaxados, mas ainda vacilava em encará-la diretamente nos olhos, seus frenéticos dançavam pelas ruas capturando os detalhes das diferentes edificações que cobriam o cenário, todas muito diferentes de Alabasta.

     - Certo, agradeço pela ajuda - Responderia este em caso dela souber ou não, em todo caso, Nhu perguntaria a qualquer outra pessoa que estivesse passando por ali, do contrário, este marchava na direção indicada, isto é, caso ela não estivesse seguindo também, se sentiria um pouco mais confortável diante disso, isto que, caminhar na companhia de alguém, mesmo que tenha acabado de conhecer, era mais reconfortante em um território completamente novo.

    Alguns diriam que é acaso, uma coincidência conveniente ou quem sabe um empurrão do destino, todos errados, tudo isso não passava de uma garota “de interior” tão empolgada com a cidade grande que nem processou direito a informação em seus olhos, e muito menos sua aproximação em terceiros, foi perdida em pensamentos e encantos que Raava acabou por se encontrar com o misterioso e estranho homem de capuz.

*Slam

    - Eita eita… - Quase que instintivamente, foi a primeira coisa que veio em sua cabeça enquanto tentava pegar, em meio ao ar, o óculos que acaba por cair de sua cabeça. No fim teve que se agachar para pegar o item, e foi na volta que percebeu na figura que havia esbarrado, agora se desculpando. - Não, que isso, fui eu que esbarrei em você. - Sem pensar direito, com as mãos, começou a ajustar e tirar a poeira da roupa do homem, algo como “deixa eu te ajeitar aqui por conta da bagunça que fiz”. - Eu tava andando meio distraída, desculpa aí.

    Logo o homem ia embora, afinal não havia motivos para parar no meio da rua e começar a dialogar com um completo estranho, Raava por alguns instantes permaneceu no mesmo lugar, esfregando seu óculos caído no chão com a gravata. Foi quando notou o retorno da figura de capuz, dessa vez com um pouco mais de palavras, ainda que com uma evidente dificuldade. - Eu tô indo pra lá agora, você pode vir comigo. - Respondeu com um sorriso descontraído pelo comportamento do rapaz. - Deixa eu ver aqui, eu anotei o endereço no meu caderninho… - Sem sucesso começou a revirar os bolsos do paletó. - Eeee… Eu esqueci no barco… Droga. Mas meus superiores me disseram que a base fica no porto, a gente não deve estar muito longe. Por aqui! - Raava começaria a andar numa direção qualquer, levando alguns segundos para notar que estava prestes a se distanciar do porto, escondendo a vermelhidão de vergonha no rosto dava meia volta dessa vez no sentido que achava correto. - Na verdade é por aqui…

    Continuaria andando pelo porto em busca do símbolo da marinha e estruturas relacionadas, algo que tivesse o porte de uma base de operações. O silêncio era desconfortável, mas sinceramente não havia muito o que se falar, Raava pensou em comentar sobre as tatuagens no braço do rapaz, às achava, em suas palavras: “Brutais”, porém dada a aparente natureza reservada do homem, preferiu ficar em silêncio. Caso chegassem no QG, a garota se despediria na entrada. - Eu acho que é isso, eu tenho que ir agora, mas foi legal andar em silêncio com você. O meu nome é Raava a propósito. - Começaria a se distância mais para dentro do Quartel General. - Até mais estranho! - Iria até alguém que a recepcionasse, ajeitando sua roupas e guardando os óculos dentro do paletó. - Agente Raava se apresentando, fui transferida recentemente.

    Quando concordou seguí-la, com um aceno de cabeça sucinto, soprou o alívio, saia do pesar de seus ombros, postou enfim suas esperanças em encontrar de maneira mais rápida a localização do QG naquela mulher, embora a interação social fosse necessária, não que realmente fosse um problema, era muito melhor do que andar pelas ruas desorientadas em busca de um edifício característico… Ironicamente, o resultado era o mesmo, já que agora a diferença se fazia apenas na presença de um outro alguém, que lhe provocava um pouco de insegurança, forçando Nhu a manter uma postura um pouco mas rígida do que o habitual, não que isso o fizesse parecer uma parede com pernas transitando ao lado da mulher, mas não se atrevia a puxar nenhum tipo de assunto.

…

    - Ah… Obrigado por… se perder por ai comigo(?) - Dizia com incerteza na frase, ela não havia o guiado até ali então… - Até mais, Raava. Nos vemos por aí! - Num tom agora de confiança, perdendo mais daquela sensação travada que se encontrava, ela estava ali para serviços, quem sabe em um futuro próximo eles pudessem se encontrar novamente, ademais, laços seriam desnecessários por hora.

Despediu-se com um aceno, embora, seguissem adentro do mesmo edifício, mas a empolgação daquela para se apresentar para o novo superior era diferente, algo que acompanhou de longe sorrindo tímido por baixo do capuz - Ah… Certo, onde estávamos mesmo?- Elucidou-se deixando de lado estas distrações que acabaram de acontecer, o plano original para ter ido até aquela ilha, alçou o passo para dentro, já partindo em busca dos quadros de procurados, caso fosse complicado demais para encontrar, não faria cerimônia, apenas bastava perguntar para um oficial presente no local e talvez pudesse ter uma resposta. Neste meio tempo, Nhu se postava por entre pequenas aglomerações, conversas alheias que pudesse ouvir e bisbilhotar, seus interesses estavam naquelas que se referirem a criminosos locais, de baixo ou exaltado renome. - Estou atuando como caçador de recompensas, preciso de informações sobre esses procurados - Esta sendo então sua última tentativa para encontrar algo, perguntando ao próprio oficial que tivesse lhe entregue o papel com a cabeça e o preço da qual do baderneiro.

   Os métodos de Raava poderiam ser questionados, mas certamente não seus resultados, o confuso agradecimento de Nhu fazia a garota virar-se para trás, ainda andando de costas, e com um sorriso fazer o simples sinal de ok com a mão, algo como um: "Não tem de que." Não estava feliz apenas pelo agradecimento, mas pelo fato de que o rapaz parecia soltado mais um pouco. Também não chegou a pronunciar seu nome, mas por mais que ambos estivessem no mesmo local, e que uma meia volta volver junta de uma simples pergunta resolveria tudo, Raava optou por permanecer no mistério, pois quem sabe assim os dois teriam um assunto inacabado para conversar futuramente, e a garota tinha uma pequena impressão que se encontrariam de novo.

“Vixe que vexame” pensou ou ouvir o “carão” para o rapaz de vermelho, inconsciente Raava levava a mão até o colarinho, apertando melhor sua gravata frouxa, e agradecendo mentalmente por ter feito questão de vestir aquele terno odioso no primeiro dia, por sorte havia começado com o pé direito, por mais que seus dedões já estivessem incomodados e quase inchados naquela sapatilha desconfortável e apertada.

Não deixava de ficar surpresa com seu aparente grupo… Peculiar, teria ficado feliz se o jovem de antes, Nhu, coincidentemente fizesse parte do mesmo grupo de novatos; assim pelo menos teria um rosto familiar, mas este não parecia ser o caso. “Minha ambição?” Pensou consigo mesma ao mesmo que já imaginava a resposta, Raava no entanto ainda não possuía a facilidade de comentar sobre seu passado, e parecia ser ainda mais perigoso mencionar que só estava ali por informações, e se a confundem com uma espiã? Embora fosse praticamente este o trabalho que todos ali estavam dispostos a fazer, mas você entendeu!

“É… uma resposta genérica e nada objetiva assim não é uma má ideia.” Elogiou mentalmente o homem de cachos loiros, não deixava de pensar que, assim como Raava, o homem omitia suas intenções, ou seria possível que seu objetivo fosse mesmo algo tão simples? “Eu acho que existem pessoas descomplicadas assim.” De qualquer forma precisava bolar algo parecido, sem muita informação, mas que ainda se mantivesse verdadeira consigo mesma. — Bom eu… — respirou fundo, se livrando do nervosismo temporário e voltando ao seu jeito de sempre. — Pode-se dizer que o Governo Mundial é uma lembrança muito importante pra mim, por isso quero evoluir e crescer nessa organização que significa tanto… Hmmm os detalhes da história são um pouco mais complicados, mas isso a gente vai se conhecendo com o tempo! Tipo, eu nem sei o nome de vocês nem nada, ficaria estranho me abrir do nada, né?